Desde
o século XX, mais especificamente a partir da década de 70, surgiu uma nova
perspectiva da fé cristã, um novo jeito de vivenciar o cristianismo. Esta
ramificação recebeu a alcunha de neopentecostalismo. Isto porque, sua origem
remonta ao pentecostalismo clássico, surgido no início do mesmo século. Com uma
prática litúrgica bem diferente de seus antecessores, o novo movimento
rapidamente alcançou as massas, aumentando significativamente o percentual dos
ditos “evangélicos” no Brasil. Estes, conforme explica Ricardo Mariano,
No plano teológico,
caracterizam-se por enfatizar a guerra espiritual contra o Diabo e seus
representantes na terra, por pregar a Teologia da Prosperidade, difusora da
crença de que o cristão deve ser próspero, saudável, feliz e vitorioso em seus
empreendimentos terrenos, e por rejeitar usos e costumes de santidade
pentecostais, tradicionais símbolos de conversão e pertencimento ao
pentecostalismo (2004, p. 123).
Esses
elementos contribuíram para que essa vertente do pentecostalismo “caísse na
graça do povo”, proporcionando um crescimento fenomenal. Assim, em função da
grande aceitação pública, muitos líderes de igrejas históricas (batistas,
presbiterianos, congregacionais, metodistas), visando o aumento do número de
membros em suas congregações, decidiram empregar alguns dos métodos
característicos desse movimento. No princípio, entretanto, as modificações se
processaram exclusivamente no campo litúrgico. Posteriormente, foram
introduzidas no âmbito teológico, provocando um estrago tão grande que, em
alguns casos, a reversão é praticamente impossível.
A partir
desse alicerce, foi edificada uma nova ortodoxia cristã, da qual o arcabouço é a
doutrina neopentecostal. Destarte, ideias como a confissão positiva, maldição
hereditária, unção de objetos e pessoas, teologia da prosperidade e a
atribuição de super poderes aos líderes, passaram a ser, aos olhos do povo,
identificados como parte integrante da teologia evangélica. Portanto, criticar
tais pensamentos se tornou o mesmo que blasfemar.
Todavia,
ao analisarmos os pontos fundamentais dessa nova faceta do cristianismo, é
possível encontrar diversos elementos oriundos de religiosidades primitivas,
estranhas à fé cristã, sendo a principal delas o xamanismo. Acerca desta, cabe
ressaltar que se trata de uma religião, característica de um ambiente tribal, centrada
na figura do xamã, palavra do idioma siberiano tunguska que designa o indivíduo, homem ou mulher, que estabelece o
vínculo com o mundo sobrenatural, agindo como sacerdote, curandeiro,
conselheiro, guardião da memória e das lendas e, às vezes, até guerreiro, se
for um guerreiro-xamã, uma espécie de guerreiro sagrado contra o mal. O termo
original shaman significa, literalmente, “aquele que conhece”. Vulgarmente falando, trata-se de uma espécie
de pajé ou feiticeiro. Esse indivíduo, geralmente, é dotado da capacidade de controlar tecnicamente o êxtase
seu e o alheio. Sendo o xamã o centro da religiosidade xamânica, não há a
necessidade de uma escritura sagrada, pois os ensinamentos são transmitidos
oralmente pelo xamã.
Quanta
semelhança com o neopentecostalismo! Tal como ocorre no xamanismo, o culto
neopentecostal gira em torno de um líder carismático, conhecido como “ungido do
Senhor” (o xamã). Este, conforme é ensinado, é “aquele que conhece”, é o
“indivíduo, homem ou mulher, que estabelece o vínculo com o mundo
sobrenatural”. Ele é o canal de comunicação entre o “mundo espiritual” e os
fiéis. Por isso, age como sacerdote, curandeiro, conselheiro, guardião da
memória e das lendas e, às vezes, até como guerreiro espiritual contra o mal,
expulsando demônios, quebrando maldições, feitiços, etc. O ungido do Senhor é
alguém que tem a capacidade de
controlar tecnicamente o êxtase (estado alterado de consciência) seu e o
alheio. Ele faz com que as pessoas caiam, pulem, dancem, tenham tremeliques,
apenas com seu sugestionamento. Sua palavra é lei, ninguém pode contrariá-la,
porque, se o fizer, “a mão do Senhor irá pesar”. Sendo assim, pouco importa o
que a Bíblia diz, o importante é palavra do “ungido do Senhor”, é aquilo que
ele faz ou o que ele diz que pode fazer.
O mais
impressionante, no entanto, é que as semelhanças não param por aí. No
xamanismo, existe a crença de que há a necessidade de buscarmos força e poder
através do contato com os espíritos dos animais, visto que estes estão mais
próximos da Fonte Divina. Esses espíritos trazem consigo seus talentos
específicos, uma espécie de essência espiritual, e, por meio disso, transmitem
aos homens a sua sabedoria, aumentam a resistência a doenças, acuidade mental e
a autoconfiança. Por conta disso, em suas danças e rituais, os xamanistas
imitam animais, tais como o leão e a águia. Existem até canções dedicadas a
esses seres. De igual modo, nas igrejas neopentecostais propaga-se com
frequência, dentre um diversificado cardápio de unções, a unção dos quatro
seres viventes. Por ocasião de sua concessão, que supostamente é obra do
Espírito Santo, o indivíduo começa a agir como um dos quatro seres (leão,
águia, novilho ou homem), andando de quatro como um leão, batendo asas como uma
águia, etc. Isto é, assim como os xamanistas, os neopentecostais, em suas
danças e rituais, imitam animais.
Diante
disso, eu te pergunto: como posso dar crédito a algo que, além de não se basear
na Bíblia, apresenta fortes semelhanças com uma prática religiosa mais antiga
que as Escrituras, mais antiga que o próprio judaísmo, que remonta, na verdade,
a um período anterior à Revelação Divina, e que nada tem a ver com Ela? A base,
como falamos, é completamente empírica e fundamentada pela palavra do ungido do
Senhor. O fato é que, atualmente, muitos líderes têm implementado em suas
igrejas diversas técnicas psicanalíticas com o fito de atrair e manipular. Não
estou me referindo, entretanto, à análise de um paciente, mas à hipnose de
grupo, ao sugestionamento, ou seja, a tentativa de induzir um estado alterado
de consciência no público. No xamanismo, busca-se também alcançar e induzir os
outros a alcançarem esse estado. É claro que, normalmente, a indução ocorre
através da ingestão de uma bebida alucinógena, conhecida como ayahuaska.
Destarte,
fica evidente a relação entre essas religiosidades, o que torna o comportamento
neopentecostal, bem como sua teologia, no mínimo, estranho ao cristianismo.
Mesmo assim, muitos tentam justificar essas práticas recorrendo ao famoso
“conselho de Gamaliel”, registrado em Atos 5.34-39. Contudo, é necessário
salientar que tal conselho não se aplica a nós, até porque Gamaliel nem cristão
era. Ora, será que um conselho vindo de um rabino que fazia parte da seita
judaica que se opunha ao cristianismo teria validade para a Igreja de Cristo?
Se fosse válido, o apóstolo Paulo não teria dito a Tito que tapasse a boca dos
falsos mestres (Tt 1.10,11), nem teria chamado os maus obreiros de cães, mas,
ao contrário teria dito: “não perturbem os que ensinam diferente do evangelho,
pois poderemos estar indo contra o Senhor.” Além disso, o crescimento de uma
igreja não é sinônimo da aprovação de Deus. O islamismo é a religião que mais
cresce em todo o mundo. Só por isso, é de Deus? É óbvio que não. Se fosse
assim, o mormonismo e o kardecismo, que têm encontrado bastantes adeptos no
Brasil, teriam a aprovação do Senhor. Outrossim, cabe ressaltar que milagres
também não significam aprovação de Deus. Isto fica claro em Mt 7.21-23, onde
Jesus condena os indivíduos que realizavam prodígios em nome do Senhor.
Ademais, João Batista, homem de Deus que atraía multidões não realizou nenhum
milagre.
Portanto,
vivamos a espiritualidade cristã tal como é apresentada pelo texto bíblico, e
abandonemos os comportamentos tresloucados incentivados pelos telepregadores.
Precisamos entender que, conforme ensina o apóstolo João em 1 Jo 2.20-27, todos
nós somos ungidos do Senhor e que a unção é o próprio Espírito Santo que habita
em nós, e não um fluido espiritual, semelhante ao fluido cósmico universal
apresentado pelos kardecistas.
Pr. Cremilson Meirelles
BIBLIOGRAFIA
MARIANO, Ricardo. Expansão pentecostal no Brasil: o
caso da Igreja Universal. Estudos avançados, 18 (52): 121-38, 2004.
ELIADE, Mircea. O Xamanismo e as Técnicas Arcaicas do Êxtase. São Paulo: Martins Fontes.
1998.
XAMANISMO OU CRISTIANISMO?
Reviewed by Pr. Cremilson Meirelles
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22:44
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Gostei muito do texto, mas fiquei com um pensamento.
ResponderExcluirConcordo com a questão do neopentecostalismo, mas dizer que outras religiões não tem aprovação do Senhor?
Deus que é O Todo poderoso, Soberanamente Justo e Bom, criou a todos nós, não facultaria outros caminhos de acesso a Ele?
Assim, onde estaria a justiça de Deus com aqueles que jamais puderam conhecer Jesus nas mais diversas regiões de nosso planeta?
Entendo sua inquietação a respeito da afirmação que fiz. Contudo, a exclusividade de Cristo como "o caminho" (Jo 14.6) é bem evidente nas Escrituras. Basta ler Rm 10.13-17. Não há salvação sem Cristo. Até porque, se assim fosse, não haveria necessidade da crucificação, já que mesmo sem crer na obra redentora alguém pode ser salvo.
ExcluirUm bando de preconceituosos, racistas,julgadores, falando que as religiões não são de Deus,como escutei ainda essa semana, além de falarem que os espiritualistas são só Demônio, os homossexuais são maldição de Deus, que triste isso, vão arrumar o q fazer e por na pratica os ensinamentos de Jesus, seus julgadores sem coração
ResponderExcluirMe parece que há um equívoco relativo à interpretação dos ensinamentos de Jesus. Ele nunca coibiu o uso do senso crítico. Na verdade, ele mesmo incentivou o olhar crítico diante dos ensinos que recebemos: "Acautelai-vos, porém, dos falsos profetas, que vêm até vós vestidos como ovelhas, mas interiormente são lobos devoradores. Por seus frutos os conhecereis. Porventura, colhem-se uvas dos espinheiros ou figos dos abrolhos? Assim, toda árvore boa produz bons frutos, e toda árvore má produz frutos maus. Não pode a árvore boa dar maus frutos, nem a árvore má dar frutos bons" (Mt 7.15-18). Como poderia emitir um parecer sobre os frutos de quem quer que seja sem que isso configurasse um julgamento? Aliás, vale ressaltar que Jesus disse que devemos julgar: "Não julgueis segundo a aparência, mas julgai segundo a reta justiça" (Jo 7.24). Perceba que, nessa afirmação, o que ele condena é o julgamento superficial, baseado na aparência, e não o que resulta de análise; justamente o oposto de sua fala. Afinal, você me acusou de ser racista, de não praticar os ensinamentos de Jesus, sem nem ao menos me conhecer, somente com base em um texto que não versa sobre esses assuntos. Além disso, é digno de nota que sua fala contém uma série de julgamentos. Logo, como poderia acusar alguém de ser julgador?
ExcluirO que posso dizer é que só consegui iniciar processo de cura i terior com ritual de ayahuasca e xamanismo. Enquanto isso vivia engessada nós nós ensiname bíblicos que em nada né ajudavam a ME CONHECER.
ResponderExcluirMuito triste saber que sua experiência nos arraiais evangélicos foi ruim. Contudo, isso não descredibiliza a fé cristã. A Bíblia continua sendo suficiente "para que o homem de Deus seja perfeito e perfeitamente instruído para toda boa obra" (2Tm 3.17).
ExcluirSe a pessoa meditar com músicas xamã tem algum problema ?
ResponderExcluirBem, embora essa não seja a proposta desse artigo, creio que músicas cristãs com letras bíblicas favorecem muito mais a meditação de um servo de Deus que melodias satânicas. Afinal de contas, essas músicas têm por objetivo viabilizar o êxtase, e não proporcionar uma reflexão sobre o ensino bíblico. Até porque, a meditação cristã é uma reflexão sobre o que a Bíblia diz (Sl 1), diferente do que ocorre em outras religiões.
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