Pastoral redigida para o Boletim Dominical da Primeira Igreja Batista em Manoel Corrêa
Sempre que o termo “dízimo” é citado
há quem questione sua contemporaneidade, argumentando que, como sua observância
está atrelada à lei mosaica, e esta foi abolida (2Coríntios 3.14), fazê-lo na
atualidade seria o mesmo que negar a obra redentora de Cristo. Contudo, antes
de abraçar esse raciocínio, deve-se levar em conta que, ainda hoje, há
princípios exarados no livro da lei que permanecem em vigor. Um exemplo disso
são os 10 mandamentos. Mas, como podemos saber o que ainda vigora e o que já
está prescrito? Como diferençar isso? É o que veremos a seguir.
Inicialmente,
é necessário frisar que a lei veterotestamentária possui duas formas básicas,
denominadas: casuística e apodítica. As leis casuísticas, como sua etimologia
sugere, tratam de casos específicos, buscando solucioná-los a partir da
aplicação de princípios gerais. No Pentateuco, há diversos exemplos desse tipo
de legislação. Um deles se encontra em Êxodo 21.2: “Se comprares um servo
hebreu, seis anos servirá; mas, ao sétimo, sairá forro, de graça”. Perceba que
a lei relativa ao tempo de serviço do escravo só era aplicável a um israelita
que comprasse um escravo, e não a qualquer pessoa. Isto é, não se trata de um
princípio geral. As leis apodíticas, ao contrário, são princípios gerais e
absolutos, cuja aplicação não depende de quaisquer condições precedentes. Por
essa razão, são construídas como cláusulas breves e imperativas. Os exemplos
mais evidentes dessa forma legal estão no decálogo (os 10 mandamentos): “não
matarás” (Êxodo 20.13). Contudo, como declaram Gordon Fee e Douglas Stuart:
“[...] estas leis, embora sejam limitadas na sua redação, são muito abrangentes
no seu espírito” (p. 143, 1984). Por conseguinte, são atemporais e universais;
ou seja, não se aplicam somente ao israelita do Antigo Testamento.
É
justamente com base nessa distinção entre as formas da lei hebraica que a
maioria dos teólogos diferencia os aspectos civis, cerimoniais e morais da
legislação do Antigo Testamento. Pois, enquanto as leis apodíticas transcendem
os casos particulares, as casuísticas se aplicam especificamente à vida civil,
religiosa, e ética de Israel. Por conta disso, grande parte da lei mosaica tem
sua aplicabilidade limitada ao povo da antiga aliança. Afinal, as “[...] leis
casuísticas, ou caso-por-caso, constituem uma grande porção dos mais de
seiscentos mandamentos achados na lei [...]” (FEE; STUART, p. 144, 1984). As
apodíticas, por outro lado, mantêm sua aplicabilidade, independente do povo,
tempo ou lugar.
Cabe
salientar também, que as leis casuísticas são, na verdade, uma aplicação
específica dos princípios gerais, expressos nas leis apodíticas. Isso significa
que, se desconsiderarmos os casos particulares, nos depararemos com os princípios
gerais e atemporais. A partir das leis referentes à escravidão, por exemplo,
podemos concluir que Deus ama o ser humano independente de sua condição social;
porquanto embora os outros povos oprimissem seus escravos, a lei do Senhor, com
suas rigorosas salvaguardas, impedia que isso acontecesse entre os israelitas,
além de proporcionar condições dignas de trabalho. Essa constatação,
entretanto, não deve levar-nos à conclusão de que podemos ou devemos escravizar
pessoas; mas destaca a justiça e o amor incondicional do Todo-poderoso.
Outro
princípio geral que pode ser depreendido das páginas do Antigo Testamento é a
leitura frequente das Escrituras Sagradas. Até porque, no Novo Testamento não
há uma ordem direta para que leiamos a Bíblia todos os dias. Tal prática,
geralmente, se baseia nos princípios presentes no Antigo Testamento, ou em
inferências a partir de versículos neotestamentários. Um dos textos mais
empregados para esse fim é o Salmo 1, no qual a Bíblia assevera que o homem
bem-aventurado é aquele que medita, com prazer, de dia e de noite na lei do
Senhor. Outra passagem bastante utilizada é Deuteronômio 6.4-9, onde Deus
ordena ao seu povo que fale sobre a Palavra de Deus todos os dias em todos os
lugares (v.7), e a leia em todo tempo (v.8,9). É claro, porém, que o simples
fato de esse mandamento conter elementos restritos ao povo de Israel (v.9), não
indica que devamos desprezá-lo. Na verdade, conforme expusemos acima, é
necessário desconsiderar tais elementos e abraçar os princípios subjacentes.
Pois estes são atemporais e universais.
Continua...
Pr.
Cremilson Meirelles
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
FEE,
Gordon; STUART, Douglas. Entendes o Que
Lês? São Paulo: Vida Nova, 1984.
OSBORNE,
Grant R. A espiral hermenêutica. São
Paulo: Vida Nova, 2009.
ALVES,
Paulo Antônio. O mandamento do sábado no decálogo: um estudo exegético de Êx
20.8-11; Dt 5.12-15. Dissertação (Mestrado em Teologia) – Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo. São Paulo, 2015.
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