Pastoral redigida para o Boletim Dominical da Primeira Igreja Batista em Manoel Corrêa
A escravidão, conquanto fosse uma
realidade presente entre os israelitas, não desumanizava o indivíduo, como
acontecia em outras culturas. Porquanto, de acordo com a cosmovisão
veterotestamentária, escravos e livres eram igualmente criação de Deus. Essa
verdade é ressaltada por Jó em sua apologia (Jó 31.13-15): “se desprezei o
direito do meu servo ou da minha serva, quando eles contendiam comigo,
então, que faria eu quando Deus se levantasse? E, inquirindo a causa,
que lhe responderia? Aquele que me
formou no ventre não o fez também a ele? Ou não nos formou do mesmo modo
na madre?”
É importante salientar, entretanto,
que essa visão igualitária não era expressa apenas por homens (como Jó). O
próprio Deus, ao anunciar o derramamento do Espírito Santo, deixa claro que
essa dádiva seria outorgada tanto a escravos quanto a livres: “e há de ser que,
depois, derramarei o meu Espírito sobre toda a carne, e vossos filhos e vossas
filhas profetizarão, os vossos velhos terão sonhos, os vossos jovens terão
visões. E também sobre os servos e sobre
as servas, naqueles dias, derramarei o meu Espírito” (Joel 2.28,29).
A
partir desses textos, concluímos que, embora o homem, muitas vezes, na história
universal, tenha utilizado a escravidão como instrumento de opressão e
desumanização do outro, a Lei de Deus nunca subscreveu tais práticas. Tanto,
que havia diversas prescrições para evitar a pobreza extrema, uma vez que esta
levaria o indivíduo à escravidão. Até porque, a miséria o levaria a contrair
dívidas que não poderia pagar. Por conseguinte, teria de se vender para quitar
seus débitos. Um exemplo desse tipo de legislação é o ano sabático, haja vista
que, conforme detalha Deuteronômio 15.1-18, ao final de cada sete anos as
dívidas eram canceladas. O propósito dessa lei era erradicar a pobreza em
Israel: “somente para que entre ti não haja pobre [...]” (Deuteronômio 15.4a).
Outro dispositivo legal que
objetivava o equilíbrio social e a eliminação da miséria, era o “ano do
Jubileu”. Pois, de acordo com a Lei (Levítico 25.25-28), a cada 50 anos, as
propriedades vendidas deveriam ser devolvidas gratuitamente, evitando que
alguns ficassem muito ricos enquanto outros ficavam extremamente pobres. Além
disso, a Lei proibia a cobrança de juros sobre o dinheiro emprestado aos pobres
(Êxodo 22.25). Havia também uma refeição destinada aos necessitados, custeada
pelos dízimos da colheita do terceiro ano (Deuteronômio 14.28-29).
Em que pese às limitações inerentes
à escravidão, o Antigo Testamento dá indícios de que era permitido ao escravo
israelita reunir pecúlio, fazer negócios e, até mesmo, ter escravos. Senão
vejamos: em Levítico 25.47-49, a Lei preconiza que, se um israelita se vendesse
a um estrangeiro residente na Terra Prometida, ele mesmo, se a sua mão
alcançasse riqueza, poderia resgatar-se, ou seja, pagar por sua própria dívida,
a fim de libertar-se da servidão. Ora, como ele alcançaria riqueza se não lhe
fosse permitido negociar e adquirir bens para si? Da mesma forma, em 1Samuel
9.8, vemos que o servo (escravo) de Saul tinha consigo um quarto de siclo de
prata. Em 2Samuel 9.10, surpreendentemente, é mencionado que Ziba, um dos
escravos de Saul (2Samuel 9.2), possuía 20 escravos!
Diante das prescrições e exemplos supracitados,
percebe-se claramente a disposição divina de promover a justiça social. Apesar
disso, ainda há quem duvide dessa disposição, tomando por base os textos do
Novo Testamento em que a escravidão (não só a israelita) não é diretamente
confrontada. Por essa razão, na próxima pastoral trataremos da perspectiva
neotestamentária a respeito do trabalho escravo.
Continua no
próximo boletim
Pr. Cremilson
Meirelles
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
BANZOLI,
Lucas. A Bíblia e a Escravidão. São
Paulo: Clube de Autores, 2017.
DEMAR,
Gary. A Bíblia apoia a escravidão? Disponível
em: http://www.monergismo.com/textos/etica_crista/biblia-defende-escravidao_GaryMar.pdf
BARBOSA, João Cândido. O
Trabalho e a Escravidão na Visão do Apóstolo Paulo. Goiânia: Fragmentos de
Cultura, v. 24, n. 3, p. 403-411, jul./set. 2014.
GEISLER,
Norman. Ética cristã. São Paulo:
Vida Nova, 1984.
________________.
Manual popular de dúvidas, enigmas e
contradições da Bíblia. São Paulo: Mundo Cristão, 1999.
VAUX,
Roland de. Instituições de Israel no Antigo Testamento. São Paulo: Vida
Nova, 2004.
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Reviewed by Pr. Cremilson Meirelles
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